O anúncio celeste de Gabriel, o Arcanjo de Deus, à Maria, encheu-a de alegria e esperança, inebriou sua alma do amor que vem do alto e, de imediato, a despertou para o serviço ao próximo. Seus pensamentos se voltaram para Isabel, sua parenta, que também fora agraciada por Deus, concebendo filho na velhice. Não seria fácil enfrentar os cem quilômetros que separam Nazaré e as cercanias de Jerusalém, onde vivia a prima idosa com o esposo Zacarias. Porém, ao subir a colina de Arim Karen, a Virgem de Nazaré ouve voz vibrante de saudação: “Bendita és tu entre as mulheres! Como pode vir a mim a Mãe do meu Senhor!” (Cfr. Lc 1,42 .45). Duas mães se abraçam com a ternura da fé e a certeza de que “para Deus nada é impossível” (Lc 1, 37).
Sobre esta viagem de desprendimento e amor fraterno que faz Maria, o Papa Francisco, em sua homilia, em Cuba, no ano de 2015, refletiu: “Geração após geração, dia após dia, somos convidados a renovar a nossa fé. Somos convidados a viver a revolução da ternura, como Maria, Mãe da Caridade. Somos convidados a ‘sair de casa’, a ter olhos e o coração abertos aos outros”. E mais adiante, diz: “Como Maria, Mãe da Caridade, queremos ser Igreja que sai de casa, que sai de seus templos, que sai de suas sacristias, para acompanhar a vida, sustentar a esperança, ser sinal de unidade de um povo nobre e digno”. As palavras do Papa, ditas num país comunista que cerceia a liberdade religiosa e as expressões natas de fé, têm, certamente, especial sentido. Medidas opressoras contra o direito de crer, confinando fieis no silêncio dos templos, são contraditórias diante de um pretenso programa igualitário. Nenhum poder humano tem o direito de impedir o povo de praticar sua fé e realizar as obras que da fé decorrem.
O Papa deseja, além disso, demonstrar a todo o mundo, que, além das liturgias e das legítimas expressões devocionais, a vida de quem crê em Cristo não se limita às quatro paredes das igrejas. Jesus nasceu na gruta santa de Belém, frequentou a Sinagoga de Nazaré, fez peregrinações ao Templo de Jerusalém, e também viveu missionariamente nos caminhos da Galileia e da Judeia espalhando o amor, o perdão, a paz. Sobre ele foi escrito: “passou a vida fazendo o bem” (cfr. Atos 10, 38).
Outra viagem de Maria, dessa vez com José, seu casto esposo, quando tiveram que migrar para o Egito com o fim de defender o recém-nascido contra a violência dos poderosos cegos pelo poder, nos faz refletir. Quantas vezes teremos de empreender meios, ainda que nos obriguem a sair da nossa zona de conforto, para defender os princípios deixados pelo Filho de Deus em favor da vida, da dignidade e das necessidades da pessoa humana?
Estamos sempre a caminho. A vida é dinâmica. A força da fé, a robustez da oração, o alimento dos sacramentos tomados entre as paredes sagradas nos dão coragem e alegria no desenrolar de nossas rotas, levando-nos sempre ao encontro do Senhor que vem. Os exemplos nos impelem. Em Maria, pode se ver a força da fé capaz de mudar situações penosas em sublimidade que salva, como escreveu também Francisco: “Maria é aquela que sabe transformar um curral de animais em Casa de Jesus, com pobres paninhos e uma montanha de ternura” (EG 286, 2013).
O mesmo Francisco, a 8 de dezembro de 2014, rezou à Mãe do Senhor, nos seguintes termos: “Neste tempo que nos conduz à festa do Natal de Jesus, ensina-nos a ir contracorrente: a despojar-nos, a abaixar-nos, a doarmo-nos, a ouvir, a fazer silêncio, a descentralizar-nos de nós mesmos, para dar espaço à beleza de Deus, fonte da verdadeira alegria”.
Feliz Natal!