Em audiência pública realizada nesta sexta-feira, 3, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a atuação de juízes federais em varas eleitorais, com objetivo de julgar crimes comuns conexos a crimes eleitorais, foi alvo de controvérsia, colocando em lados opostos entidades representativas da magistratura e presidentes de tribunais regionais.
A questão veio à tona após o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) ter decidido, em março, que cabe à Justiça Eleitoral julgar casos que envolvam simultaneamente caixa 2 de campanha e outros crimes conexos, como lavagem de dinheiro e corrupção, que até então vinham sendo julgados pela Justiça Federal, no âmbito de operações como a Lava Jato.
A decisão do Supremo causou polêmica no meio jurídico, após críticas de procuradores e juristas de que a decisão abriria uma brecha para a impunidade. O principal argumento dos críticos é o de que a Justiça Eleitoral, cuja primeira instância é hoje composta exclusivamente por juízes estaduais, não teria recursos suficientes para julgar um grande número de processos envolvendo crimes complexos de competência federal.
Para lidar com a questão, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu ao TSE que permita a atuação de juízes federais em varas eleitorais, posição que é defendida pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).
Debate
“Nós temos que encarar essa realidade, a Justiça Eleitoral precisa ter uma restruturação adequada para que possa julgar crimes que não foram concebidos para a sua estrutura”, disse o presidente da Ajufe, Fernando Mendes. “A principal proposta é que dentro de uma zona eleitoral possam trabalhar dois juízes, um juiz estadual e um juiz federal”, acrescentou.
Já o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Jayme de Oliveira, foi contra a proposta. “O combate à corrupção no Brasil não é titularidade de algumas pessoas e de alguns juízes, ela é de toda a magistratura brasileira”, defendeu.
Para a Oliveira, a Constituição é clara ao dar exclusividade ao juiz estadual para atuar nas varas eleitorais, que são a primeira instância da Justiça Eleitoral. “Não há nenhum problema [juiz federal atuar na esfera eleitoral], desde que alterada a Constituição”, ponderou.
Para os defensores da atuação dos juízes federais nas varas eleitorais, a expressão “juízes de direito”, que na Constituição especifica os magistrados que devem atuar nas varas eleitorais, poderia ser interpretada de modo a incluir juízes federais, e não somente os estaduais, como é o entendimento corrente.
“Nós colocaríamos o juiz federal em reforço. Ficariam lá dois juízes, não há nada de anormal”, defendeu o presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí, Rocha Sobral. “Não adianta jogar palavras ao vento, dizendo que há essa estrutura [para julgar crimes complexos], não há”, disse.
O presidente do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) e do Colégio de Presidentes dos Tribunais Regionais Eleitorais, Carlos Padin, se colocou contra a proposta. Para ele, a atual estrutura da Justiça Eleitoral tem plena capacidade para lidar com qualquer tipo de caso.
“Toda a magistratura eleitoral, principalmente a de primeiro grau, está plenamente capacitada, se sente plenamente capacitada, de dar conta não só desses processos, mas como de qualquer um outro processo que venha bater às portas desses juízes”, afirmou Padin.
Próximos passos
Responsável por supervisionar a audiência pública, o ministro do TSE Og Fernandes disse que pretende entregar em 14 de maio um relatório sobre o assunto para a presidente do tribunal, ministra Rosa Weber, a quem caberá decidir sobre os próximos passos.
Há no TSE ao menos dois pedidos, da PGR e da Ajufe, para que seja permitida a atuação de juízes federais em varas eleitorais de primeira instância. Rosa Weber é quem deve decidir se pautará ou não o assunto para discussão em plenário.
Por se tratar de questão constitucional, é possível que a atuação de juízes federais em varas eleitorais seja discutido ainda no Supremo, onde ao menos um ministro, Alexandre de Moraes, já se manifestou publicamente no sentido de que para isso seria necessário modificar a Constituição.
Fonte: Agência Brasil