Especialista analisa lei da terceirização

A Câmara dos Deputados aprovou nessa quarta-feira, 22, o projeto de lei (PL) 4.302/1998 que visa regulamentar o serviço de terceirização para todas as atividades da empresa. O PL foi aprovado com 231 votos favoráveis, 188 contrários e oito abstenções, e agora, depende apenas da sanção de Michel Temer.

Vale destacar que atualmente, não existe uma legislação específica sobre o serviço de terceiros. O enunciado nº 331 da súmula da Corte Trabalhista do Tribunal Superior do Trabalho (TST) regulamenta que a terceirização é permitida somente para as chamadas “atividades-meio”, como o serviço de limpeza, segurança e manutenção, ou seja, funções secundárias que não estão diretamente ligadas ao objetivo principal da empresa.

A nova legislação prevê que a contratação terceirizada de trabalhadores poderá ocorrer sem restrições em empresas privadas e na administração pública.

De acordo com o advogado trabalhista, José Lúcio Fernandes, a terceirização é uma precarização do trabalho e traz consequências para a qualidade do serviço prestado. “Acho que essa proposta está sendo muito radical, pois coloca a terceirização não só como atividade-meio, mas também como atividade-fim. Significa que uma escola pode contratar professores através de uma terceirizada, uma unidade de saúde pode contratar enfermeiros, médico, que receberam um salário bem menor e, consequentemente, não terão uma boa qualificação. Até porque, muitas das vezes a terceirizada não oferece um curso de qualificação”, comentou. “O trabalhador preparado certamente recebe um salário maior e a qualidade do serviço vai ser melhor. As terceirizadas pagam um salário muito pequeno, não qualifica e não prepara o trabalhador, por isso, a qualidade do serviço tende a ser ainda menor”, completou.

O advogado alertou, também, sobre o impacto que a terceirização pode causar no mercado de trabalho. “Uma vez que, a empresa poderá contratar funcionários para exercerem atividades-meio e atividades-fim, ela tem a opção de contratar um terceirizado e pagar menos. A empresa visa o seu lucro, e será mais vantajoso demitir seus empregados e contratar terceirizados. Esse ciclo vai aumentar a taxa de desemprego no país”, reforçou.

IMPACTOS NO SETOR PÚBLICO

No caso do serviço público, como não há impedimentos expressos no texto, a legislação abre brecha para que o setor seja terceirizado. A exceção será as atividades essenciais ao Estado, como judiciário e polícia. Outras funções, mesmo que ligadas a atividade-fim, poderão ser terceirizadas em órgãos ou empresas públicas.

Segundo o especialista, esse projeto infringe o conceito essencial do concurso público, que é a democracia no acesso e a meritocracia ao conseguir a vaga. Dessa forma, o poder público pode desistir de realizar concursos. “Os órgão públicos já contratam o serviço terceirizado. A intenção do governo e avançar no serviço público, pra que outros cargos, também sejam exercidos por trabalhadores terceirizados. Os cargos de agente de estado, polícia, justiça e outros afins, não podem se privatizar. O concurso público garante estabilidade, um salário melhor e qualidade nas atividades prestadas. O serviço já está precário, se terceirizar e contratar mais pessoas a titulo de temporário vai ficar muito complicado”, destacou.

IMPACTO NA ECONOMIA

Fernandes salientou que a terceirização vai estreitar a relação trabalhador-serviço. Sendo assim, trará problemas graves na classe trabalhadora brasileira. “O baixo salário do terceirizado mal dá para pagar o aluguel e suas despesas. Se não consegue arcar com seus custos, terá dificuldade em consumir, se o consumidor não consome o mercado não produz e não vende”, explicou. “Os empregados vão se tornar pessoas jurídicas e vão ganhar menos. Isso afeta diretamente a receita do INSS, que recolherá menos da contribuição previdenciária”, frisou.

CAUSAS TRABALHISTAS

Na proposta aprovada na última quarta-feira, em casos de ações trabalhistas, caberá à empresa terceirizada o pagamento dos direitos questionados na justiça, se houver condenação. Se a terceirizada não tiver dinheiro para pagar, a empresa contratante será acionada e poderá inclusive, ter seus bens penhorados para o pagamento da causa. “A empresa terceirizada normalmente não tem um patrimônio público, costuma ter apenas uma sala. O trabalhador não tem nenhuma garantia em uma eventual insegurança trabalhista. Se os seus direitos não forem pagos, ele terá de reclamar contra a empresa terceirizada e só depois poderá reclamar contra a subsidiária e, mesmo assim, corre o risco de não receber”, finalizou.

PROJETO DE LEI 4330/2004

Os senadores afirmaram que poderão votar nos próximos dias o projeto de lei 4330/2004, que é o mais recente sobre o tema. O texto aprovado pela Câmara em 2015 traz mais garantias aos trabalhadores do que o projeto enviado pelo presidente Michel Temer.

O projeto 4330/2004 traz 50 garantias favoráveis aos trabalhadores. Entre elas, impede que as empresas demitam seus funcionários e os recontratem como terceirizados; garante benefícios como alimentação e transporte, e obriga a empresa principal a fiscalizar se contribuições, como INSS e FGTS, estão sendo pagas. O PL, ainda, permite que o trabalhador terceirizado entre na Justiça contra as duas empresas, em caso de ações trabalhistas.

Se o texto do Senado for aprovado, Temer poderá escolher o que pretende sancionar ou vetar as duas propostas.




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