Por que não Deus? Investigando as razões ocultas por trás da rejeição da Hipótese Deus pela academia – Parte 17

No artigo anterior afirmamos que o materialismo, naturalismo e relativismo são as linhas de pensamento derivadas do paradigma imanentista e predominantes no campo científico. Resta desvendar o que está em sua base, o que nos leva ao núcleo da cebola que vimos descascando camada por camada em cada artigo precedente.

 

Herman Dooyeweerd oferece uma perspectiva única sobre as raízes e as limitações das grandes correntes de pensamento contemporâneas. Segundo ele, a cosmovisão prevalecente no Ocidente contemporâneo é condicionada por dois motivos básicos que moldam suas premissas e predetermina os limites da reflexão teórica.

 

O primeiro deles é o motivo da natureza. A estruturação do materialismo e do naturalismo são alicerçados na suposição de que a natureza é um sistema fechado de causalidades e regularidades.

 

O materialismo parte da premissa que a matéria é a única realidade concebível e que todos os fenômenos, incluindo os mentais, sociais ou religiosos devem ser explicados em termos de interações materiais ou a partir dessas. O naturalismo, por sua vez, pressupõe que todos os eventos são determinados por leis imutáveis, acrescentando que tudo o que existe pode ser explicado por causas naturais e leis físicas. Segundo tais pressupostos, fenômenos como a mente e a moralidade são tidas como produtos de processos cerebrais e explicados tão somente em termos de evolução biológica e seleção natural.

 

Ambos são fundados no imanentismo pois rejeitam qualquer forma de explicação sobrenatural ou transcendente, insistindo que o universo e todos os fenômenos nele contidos são produtos de processos materiais/naturais auto criativos e infra regulados.

 

Por algum tempo tais concepções foram dominantes nas ciências humanas na tentativa de explicar o comportamento humano e as dinâmicas sociais. No entanto, nas últimas décadas, essas abordagens praticamente sucumbiram às críticas.

 

Os principais questionamentos partem exatamente do pólo antagônico do motivo base da natureza, a liberdade.

 

Tanto no materialismo quanto no naturalismo, a liberdade humana tende a ser reduzida a um epifenômeno derivado de outros condicionantes. O comportamento é visto como derivação ou, no máximo, como fenômenos inteiramente explicados dentro de sistemas mecânicos. A ética, a estética e a espiritualidade são reduzidas a efeitos secundários. Em contradição, o motivo liberdade, por sua vez, enfatiza a autonomia humana, a criatividade e a capacidade de transcender a tais limitações materiais/naturais. O ser humano como seu próprio senhor está chamado a domar a natureza e transformá-la de acordo com suas próprias aspirações.

 

Portanto, o motivo liberdade enfatiza a autonomia e a criatividade humanas. Uma concepção que resiste à hipótese de que haja qualquer limitação prévia ao arbítrio humano. A valorização da liberdade leva necessariamente à rejeição de tudo aquilo que possa tolher o homem de exercer plenamente sua autonomia e capacidade de criar seu próprio sentido, destino e propósito.

 

O que se verifica é a contradição elementar e insolúvel na forma da sociedade ocidental refletir sobre a realidade. Pois, de um lado, as teorias deterministas, de matriz naturalista e materialista, sugerem a rigidez e controle por fatores biológicos, estruturais, ambientais dentre outros. Já a visão libertária julga tais concepções como sendo reducionistas e simplificadoras.

 

No campo das ciências humanas não demorou muito para que as teorias materialista e naturalista se exaurissem. O triunfo da liberdade sobre a natureza se dá com a emergência dorelativismo. Uma linha de pensamento que afirma que todas as verdades são relativas ao contexto cultural, histórico ou individual.

 

A nova perspectiva condiciona o motivo natureza pelo motivo liberdade. O relativismo reconhece a pluralidade e a diversidade das experiências humanas, enfatizando a liberdade e a autonomia das diferentes culturas e indivíduos ao extremo de poderem criar suas próprias verdades.

 

Contudo, ao afirmar que todas as verdades são relativas, o relativismo cai em uma autocontradição lógica, pois a própria afirmação da relatividade é apresentada como uma verdade absoluta. Além disso, ao negar a possibilidade de uma verdade objetiva, o relativismo enfraquece a capacidade de criticar práticas culturais prejudiciais ou injustas, limitando a liberdade humana em um sentido mais profundo.

 

Dooyeweerd ajuda a elucidar que tanto o materialismo e o naturalismo (condicionados predominantemente pelo motivo natureza) quanto o relativismo (condicionado por uma tensão entre os motivos natureza e liberdade) refletem a dualidade fundamental que molda o pensamento ocidental e na qual se baseia o paradigma científico que modela, por sua vez, os princípios ordenadores do campo acadêmico.

 

Às diversas linhagens filosófico as que buscam lidar com os tema da origem e do sentido de “tudo o que há” são tentativas de negar um dos polos em favor do outro ou de buscar em vão conciliar essa dualidade. Porém cada qual falha flagrantemente visto ser impossível lidar com os dois motivos de maneira coerente.

 

Este fato é revelador dos pressupostos científicos em voga, de sua convicção em negar a hipótese Deus e de como o edifício sobre o qual se assenta o paradigma que domina o campo acadêmico é inexoravelmente contraditório e equivocado.

 




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