A Academia Brasileira de Letras sofreu mais um baque no seu elenco de imortais. O falecimento do filósofo e escritor Sérgio Paulo Rouanet abre um vazio, não apenas na ABL, mas na cultura brasileira, que deve muito a ele, sobretudo com a lei de incentivo que levou o seu honroso nome. Muitos projetos tornaram-se viáveis graças à chamada lei Rouanet.
Pessoalmente, senti muito a sua morte. Quando visitei a Alemanha, Rouanet foi me buscar no aeroporto, para dar as boas-vindas. Era um exemplar diplomata, ao lado da sua esposa Bárbara, sempre muito querida e solícita. Em outra ocasião, no chá dos acadêmicos, me puxou de lado e disse que tinha uma sugestão para me fazer: “Por que você me não faz uma conferência sobre a presença dos judeus na cultura brasileira?” Aceitei a sugestão e fiz a palestra, depois de uma ampla pesquisa na literatura existente. Vou aproveitar o tema para escrever matéria para a “Revista Brasileira”, dirigida pelo imortal Rosiska Darcy de Oliveira, quando for lançado o seu segundo número.
Ao contrário dos dias atuais, em que a cultura é nefastamente politizada, Rouanet foi um grande ministro da Cultura. Para a atriz Fernanda Montenegro, assim ele se eternizou. Para o imortal Cacá Diegues, Rouanet foi um insuperável pensador e homem de ação, merecendo todo o nosso respeito.
A Lei Rouanet foi entendida sob o enfoque de incentivo e não de paternalismo. Trabalhou na linha do social liberalismo, com a democratização do acesso aos bens culturais. Assim a cultura seria distribuída de forma justa, ampliando o chamado Produto Interno Cultural. Segundo o seu autor, da forma como foi concedida “ela seria distribuída de forma justa, mesmo para as camadas mais pobres da nossa população, gerando dois tipos de mecenato: o privado e o governamental. “ Escreveu muito sobre iluminismo e modernidade.
Os projetos apresentados somente seriam executados se estivessem de acordo com a Política Nacional de Cultura e se houvesse a garantia de uma correta aplicação dos recursos envolvidos. Assim ele comandou com sucesso um processo histórico, consagrado por uma frase clássica: “A cultura deve ser livre, sem amarras, sem paternalismo, mas com o Estado estimulando de todas as formas o seu amplo desabrochar.” Foi um grande defensor da liberdade de expressão. Rouanet deixará saudades.