Criação da rede pública de assistência social dá o tom e o caminho da 11ª Conferência

A Prefeitura tem a responsabilidade de coordenar, implantar e implementar a rede de Assistência Social de Juiz de Fora governamental e não-governamental. Esse deve ser o tom e o caminho da Política de Assistência Social, segundo a ex-ministra de Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (2010-2011) e assistente social, Márcia Lopes, que na última segunda-feira, dia 16, fez a palestra de abertura da 11ª Conferência “Assistência Social: Direito do Povo e Dever do Estado, com financiamento público, para enfrentar as desigualdades e garantir proteção social”.

Segundo informações do site da Prefeitura de Juiz de Fora, É nesse processo de entendimento que a ex-ministra entende a realização da Conferência, cuja reflexão passa pela consciência da realidade local e, principalmente, pelo ânimo e pela vontade de todos envolvidos (conselheiros, trabalhadores, usuários, gestores, legisladores e outros setores sociais) em estruturar na cidade uma nova rede estatal e pública do SUAS como política de Estado, permanente, contínua e em constante transformação. E, para rediscutir o reordenamento institucional, segundo ela, deve-se considerar a Constituição de 1988, a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) e a Política Nacional da Assistência Social (PNAS).

“Temos de ter um diálogo permanente dessas políticas para assegurar aos usuários o Sistema Único de Assistência Social (SUAS). A Assistência Social se estrutura através da prestação pública de serviços de qualidade, assegurando acolhida, renda e benefícios eventuais, convivência familiar e comunitária, apoio e auxílio nas situações de risco e vulnerabilidade e autonomia. Juiz de Fora tem cerca de 600 mil habitantes, dos quais 150 mil (50 mil famílias) inscritos no Cadastro Único. Isso não é qualquer coisa”.

De acordo com Márcia Lopes, esse contingente de pessoas é significativo e representa o tamanho da importância da Assistência Social e da sua articulação intersetorial. No caso de Juiz de Fora, no mínimo, tem-se de considerar como usuários da Política de Assistência Social todas essas cerca de 50 mil famílias inseridas no CadÚnico. Além disso, a cidade também conta, historicamente com uma grande rede parceira de serviços com a atuação de Organizações Não-governamentais, entidades que há muitos anos estão atuando nessa área para atender a população vulnerável (crianças, adolescentes, adultos, idosos, deficientes, população em situação de rua).

SAS no comando

No governo da prefeita Margarida Salomão, a Secretaria de Assistência Social (SAS) foi recriada, o que, para a ex-ministra, é fundamental para dar identidade à Assistência Social. Segundo ela, o setor tem o mesmo peso das políticas de Educação e Saúde, que têm suas identidades registradas. Nesse sentido, “a Prefeitura de Juiz de Fora tem o dever, a responsabilidade de coordenar, implantar, implementar a rede assistencial social governamental e não-governamental”, ressalta Márcia Lopes, acrescentando que a realização dessa reordenação precisa de um trabalho conjunto de todos os setores, principalmente, do Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS), Câmara Municipal, SAS e Direitos Humanos, na construção de uma rede de atendimento e de assistência social democrática com participação efetiva de todos envolvidos no processo.

“Pensar na política de assistência social é pensar no conjunto da população de Juiz de Fora, que demanda esses serviços em algum momento de sua vida. Mudanças do Estado têm de ser para o bem da população e não para complicar e burocratizar. A assistência social é direito do povo, responsabilidade do Estado, com financiamento público para enfrentar as desigualdades na população da cidade”.

A ex-ministra assinala que não existe desenvolvimento econômico e sustentável sem desenvolvimento social. E para isso, lembra Márcia Lopes, que um dos instrumentos fundamentais para a base de qualquer mudança é o Cadastro Único. “É um banco de dados incrível, é a fotografia de uma cidade, tem todos os dados. Dados que são importantes para Assistência Social, Saúde, Educação, Agricultura, Cultura, Esportes e todas as políticas transversais. É um instrumento de planejamento, uma forma de entender e enxergar a dinâmica da cidade”.

A população no CadÚnico é aquela que ganha até meio salário mínimo per capita na família. Executivo, Legislativo e Ministério Público, segundo ela, precisam estar atentos a essa ferramenta de grande valor, que possibilita a elaboração de um diagnóstico importante para melhor atender a população em situação de risco, violência e vulnerabilidade. “Esse grupo de pessoas tem de se sentir pertencente, incluído, atendido nesse processo de uma cidade em que toda a população tem o direito de ser respeitado e de se sentir digno”.

Omissão do Estado

Márcia Lopes aproveita o momento de discussão na 11ª Conferência para lembrar aos participantes que, historicamente, sempre houve uma omissão do Estado no que se refere ao financiamento social. “Uma família não pode ficar à mercê de um grupo de pessoas, de uma entidade para ser atendida. Isso é dever do Estado e só, em 1988, na Constituição, a Assistência Social se tornou uma política pública. Até ali, valia qualquer coisa: favor, ajuda, benevolência, tudo valia para denominar a assistência social. Essa era a mentalidade gerada e o Estado nunca assumiu essa responsabilidade”.

Márcia Lopes destaca que foi no governo do ex-presidente Luís Ignácio Lula da Silva, em 2003, que Assistência Social, sob a responsabilidade do ministro Patrus Ananias e com sua participação numa das secretarias e, posteriormente, como ministra, do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome, ganhou seu protagonismo com a criação e implantação do SUAS.

Márcia explica que nesse início o Orçamento para a Assistência Social era de R$ 5 bilhões para atender os mais de 5 mil municípios brasileiros, mas com a mudança de paradigma do governo, esse Orçamento da pasta passou para R$ 8 bilhões, R$ 42 bilhões (2010) e, ao final do governo da ex-presidenta Dilma Rousseff, chegou a R$ 84 bilhões (2016). Se essa política de financiamento estivesse sendo seguida, hoje, o MDS teria um Orçamento em torno de R$ 120 bilhões para atender a demanda crescente da assistência social.

Entretanto, a ex-ministra assinala que com o golpe de 2016, o Governo Federal reduziu o Orçamento para R$ 53 bilhões, recursos insuficientes para manter a rede de assistência social no país, principalmente, em momento de crise sanitária, social, política, cultural e econômica. Nesse sentido, um dos objetivos dessa Conferência é repudiar e cobrar da União e dos Estados o cumprimento da Constituição Federal na destinação de mais verbas para a Assistência Social e de respeito à coparticipação entre os entes federados, já que é dever do Estado investir na área social.

Assistência desmontada

A Assistência Social faz parte de um tripé da Seguridade Social junto com a Previdência Social e Saúde, afirma Márcia Lopes, lembrando que o atual Governo Federal vem desmontando toda a política pública constitucional e desarticulando tudo referente ao setor, além de dificultar a inclusão digital e mudar regras todos os dias. O corte de recursos no Orçamento chega a 70% do que foi deixado em 2016. Isso, somado à Medida Provisória no Congresso Nacional, que acaba com o Programa Bolsa Família e cria o Programa Auxílio Brasil, algo que não se sabe se terá continuidade depois. “É através do Orçamento que se lê a alma do Estado”.

A ex-ministra entende que os recursos são fundamentais, mas lembra que não existe o SUAS forte sem a coesão dos trabalhadores, dos usuários, das entidades prestadoras de serviços e da gestão. A Assistência Social é uma área difícil de explicar, segundo ela, porque é uma atividade diferente da Saúde, Educação e Esportes, por exemplo, que tem um produto.

“A assistência é um campo relacional, de relacionamento com as pessoas, onde se escuta, convive, integra e reúne as pessoas. Às vezes, são transformações do íntimo da pessoa, do seu jeito de ver a vida e a sociedade. É mais subjetivo. Por isso, é fundamental contar com uma equipe interdisciplinar e intersetorial, com psicólogos, assistentes sociais, sociólogos, advogados, entre outros, para assistir à população, que precisa ser orientada, protegida e participar de um processo de formação e desenvolvimento”.

Plenária Final

A partir dos debates dos cinco eixos temáticos, que se encerram nesta quinta-feira, dia 19, a Plenária Final Virtual se reúne para eleger os delegados para a Conferência Regional de Assistência Social e para aprovar o documento final da etapa municipal da 11ª Conferência de Assistência Social. Em sua palestra do dia 16, a assistente social Márcia Lopes falou aos participantes sobre a importância e os pontos centrais de cada um desses eixos: 1 – Proteção Social não-contributiva (gratuita) e o princípio da equidade (tratar diferentemente e positivamente aqueles que sempre foram tratados diferentes pelo Estado Brasileiro, tratar desigualmente os desiguais) como paradigma para a gestão dos direitos socioassistenciais no enfrentamento das desigualdades; 2 – Financiamento e Orçamento como instrumento para uma gestão de compromissos e corresponsabilidades dos entes federativos para a garantia dos direitos socioassistenciais; 3 – Controle social: o lugar da sociedade civil no SUAS e a importância da participação dos usuários; 4 – Gestão e acesso às seguranças socioassistenciais e a articulação entre serviços, benefícios e transferência de renda como garantias de direitos socioassistenciais e proteção social; e 5 – Atuação do SUAS em Situações de Calamidade Pública e Emergências.

Nesse sentido, a profissional de assistência social trabalha, debate, luta e acompanha há 22 anos essas conferências. Márcia Lopes espera que a partir do debate amplo, os delegados aprovem as deliberações e apresentem os resultados em Audiência Pública na Câmara Municipal. Para a ex-ministra, a Conferência dá o tom e o caminho para a Política da Assistência Social, ressaltando que o CMAS deve unir forças com o Legislativo e o Executivo para a cidade ter uma rede pública e estatal de assistência social. Segundo ela, essa rede tem de ser forte e unida para proporcionar atendimento de qualidade a todos como direito, valorizar os trabalhadores, além de investir em plano de carreira, concurso público, capacitação permanente, supervisão técnica de qualidade, fiscalização e cobrança de ações efetivas em prol dos usuários da assistência social.




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