Dupla “construída” há dois anos, Gabi Nicolino e Samuca misturam opostos em busca de bom resultado em Tóquio

Gabriela Nicolino não tinha nenhum velejador na família, enquanto Samuel Albrecht cresceu no mar com o pai. O primeiro barco dela chamava “Papaléguas”, enquanto o dele era o “100 jeito”. Gabi só teve a certeza de que queria ser atleta profissional após 15 anos no esporte. Samuca, por sua vez, tinha convicção desde o primeiro campeonato. Um é mais agitado e intenso, já a outra é tranquila e equilibrada. Mas as diferenças não param por aí.

“Samuca puxa (o ritmo) para chegarmos nos nossos melhores momentos, e eu tento não nos desestabilizarmos para não termos os ruins”, diz a carioca de 30 anos. “Posso ajudar com a experiência de quem já esteve nos Jogos, e ela vai me ajudar com o ânimo e motivação de quem estará lá pela primeira vez”, complementa o gaúcho de São Leopoldo, 38 anos, que esteve no Rio 2016.

Apesar das características opostas, a dupla tem mostrado bastante harmonia desde que se juntou, há dois anos, para buscar uma vaga em Tóquio 2020 na classe Nacra 17. Após viverem anos como rivais, a Confederação Brasileira de Vela (CBVela) e o Comitê Olímpico do Brasil (COB) incentivaram os dois a unirem forças. Eles aceitaram e, com apenas 20 dias treinando juntos, conseguiram a vaga olímpica para o Brasil com o 5º lugar no Mundial da Dinamarca, em 2018.  

“Sem a Gabriela, não consigo nem velejar o barco. Ela tem diversas qualidades: é atenta aos trabalhos da equipe, disciplinada e cuida da preparação física. É uma excelente profissional-atleta. Além de tudo, é bem compreensiva e ajuda muito com meus outros projetos”, conta Samuca, que também comanda a Crioula Sailing Team em regatas oceânicas. “É muito saudável trabalhar com contrapontos para achar o equilíbrio, fundamental para o sucesso”.

“O admiro muito como atleta e velejador, acho que nos complementamos bastante. Esse é um ponto importante no nosso desempenho. Ficamos felizes pela decisão acertada de formar a nova dupla, somado a um alívio, misturado com euforia, de já termos classificado o país na primeira seletiva olímpica”, explica Gabi, que, em meio aos treinos e competições, arrumou tempo para se formar em Publicidade e Propaganda na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e concluir um mestrado em Sistemas de Gestão e Sustentabilidade pela Universidade Federal Fluminense (UFF).

Mas essa foi só a primeira parte da saga da classificação olímpica. “Foram duas etapas: primeiro tivemos que conquistar a vaga para o país. Foi incrível, o melhor resultado internacional do Brasil na classe Nacra 17 até então. Fora que, finalmente, eu estava um passo mais perto de ir para os meus primeiros Jogos Olímpicos”.

“Já a seletiva nacional (que definiria a dupla classificada) foi no Mundial de 2019. Foi um ano duro, de logística intensa, com muitas viagens por conta dos Jogos Pan-americanos e do evento-teste no Japão. Todo deslocamento de material em contêineres e uma lesão do Samuca no início do ano nos fez perder quase dois meses de treinamento. Chegamos tensos para a seletiva. Mas estávamos com a cabeça preparada, velejamos muito bem em condições bastante difíceis e, no penúltimo dia, em 6º no geral, garantimos a vaga. Ainda tivemos uma quebra de material no último dia que nos custou caro, caindo para a 11ª colocação, mas a missão estava cumprida”, conta Gabriela.

Parceria

A lesão, inclusive, quase fez a dupla acabar. Samuca define o momento como o mais difícil da carreira até agora. “A medalha de prata na etapa de Miami da Copa do Mundo (2019) foi um momento muito especial, que coroou uma série de decisões tomadas em 2018 e mostrou que estamos no caminho certo para Tóquio”.

“Só que logo depois sofri uma lesão de fratura exposta no dedo, enquanto corríamos uma regata no Troféu Princesa Sofia. Isso veio como um balde de água fria. Foi um longo recomeço, com metas a curto prazo, como os Jogos Pan-americanos e a eliminatória brasileira da Nacra 17 no Mundial de 2019, na Nova Zelândia”.

Mas esse não foi o único perrengue que a dupla passou desde que começou a treinar junta. “Atualmente, a Nacra 17 chega a ser meio perigosa por causa da velocidade. Já perdi as contas de quantas vezes saí voando do barco, acabei de cabeça para baixo ou viramos sem nenhum controle do que estava acontecendo. Damos muita risada”, diz Gabi.

“Ainda fiquei sabendo da segunda gravidez da minha esposa e que minha filha nasceria bem perto da Seletiva Olímpica na Nova Zelândia. Felizmente, conseguimos fazer um treino pré-nascimento e voltar para casa. A Vitória nasceu de parto natural bem na janela que a gente estaria no Brasil. Por isso, esse é o nome dela, por estar ligada a essas conquistas, e é também o nome do barco que vamos levar pro Japão”, revela Samuca.

Dando a volta no tempo ruim, a medalha de bronze nos Jogos Pan-americanos Lima 2019 deu novo gás à dupla. Um pódio inesquecível para a velejadora: “foi o momento mais marcante da minha carreira até agora, apesar do gosto amargo de um bronze que poderia ser ouro. Não tem como comparar a sensação de conquistar uma medalha nos Jogos para o Brasil”.

Depois de passarem por essa turbilhão de emoções, é hora de focar na preparação para as temidas condições de navegação em Enoshima durante os Jogos. “Para a vela, os Jogos de Tóquio trazem uma condição técnica muito específica: por ser época de tufões no Japão, enfrentamos condições de ondas e ventos extremas. Então, nosso foco é investir no treinamento técnico nestas condições para levarmos uma vantagem frente aos outros times”, explica Gabi.

“Precisamos de treinamentos em locais específicos para encontrar essas condições. Isso significa levar toda a nossa estrutura de treinos constantemente para Florianópolis ou Punta del Este (Uruguai), por exemplo. É custoso e trabalhoso, o que não seria possível sem o apoio e a estrutura do COB e da CBVela”, completa.

O adiamento dos Jogos Olímpicos de Tóquio para 2021 não muda o astral da dupla, que segue animada e com expectativas altas para o evento.

“Quando penso em Tóquio, vem uma excitação. Ainda mais em tempos de quarentena, que não vejo a hora de voltar para a água. É algo bem positivo, um sentimento de realização, acompanhado de determinação. Estamos muito focados como equipe e queremos performar no máximo de nosso potencial. Temos uma dinâmica boa e consistente. Vai ser interessante estar em ação nos Jogos, quando a experiência do Samuca vai somar ainda mais”, elogia Gabriela.

“Ultimamente, a minha família está muito na minha cabeça. Penso que, daqui a uns anos, minhas filhas poderão perceber o tamanho disso, de ver o pai delas competindo, representando o Brasil em uma edição de Jogos Olímpicos. Isso me emociona e me deixa muito feliz”, finaliza Samuca.

Fonte: COB

 

 




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