Psicóloga esclarece sobre os cuidados alertados pela campanha do setembro amarelo

Com o intuito de alertar a população e levantar debates sobre o suicídio, o mês de setembro foi o mês escolhido pelo Centro de Valorização à Vida (CVV), do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) para realizar a campanha, conhecida popularmente como “Setembro Amarelo”, realizada desde 2014, tendo como a data principal dia 10. Apesar da data, espera-se que o assunto seja debatido o ano inteiro.

Segundo dados fornecidos pelos pela ABP, cerca de 96,8% dos casos de suicídio estavam relacionados a transtornos mentais. Em primeiro lugar está a depressão, seguida do transtorno bipolar e abuso de substâncias. Ainda de acordo com os dados, são registrados cerca de 12 mil suicídios todos os anos no Brasil e 1 milhão em todo o mundo.

De fato precisamos conversar sobre o assunto. Pensando nisso, a equipe do Diário Regional conversou com a psicóloga Andreia Stenner, gerente do Departamento de Saúde Mental da Prefeitura de Juiz de Fora, para esclarecer dúvidas referentes ao tema.

Diário Regional: A depressão é uma das principais doenças do século XXI. Ela também é uma das impulsionadoras de outro problema grave: o suicídio. Como perceber que uma pessoa com depressão pode estar próxima do suicídio?

Andreia Stenner: Em primeiro lugar, nós devemos pensar que os determinantes de saúde não são só de psíquico patológico [relacionados aos problemas mentais]. São determinantes sociais. Então, a gente vai trabalhar não com a ideia de adivinhar ou que tenha um instrumento capaz de verificar isso, mas a gente vai identificar fatores protetivas e fatores de riscos. O que são fatores protetivos? São os determinantes sociais de saúde. Então, se essa pessoa está em um bom círculo familiar e comunitário; se ela tem vínculos preservados; se ela está passando por um sofrimento, mas ela ainda tem lugares onde frequenta; se ela tem lazeres preservados; se ela tem vínculo de trabalho preservado; isso tudo vêm a colaborar  diante de uma situação de sofrimento existencial, ajudando a não perder o sentido da vida.

O que faz a pessoa escolher o suicídio é cessar uma dor não compartilhada. Então, temos os fatores de riscos, podendo ser observado quando a pessoa fica isolada; altera o comportamento; quando ela para de fazer coisas; se ela diminui sua circulação social; se ela diminui as pessoas com quem ela convive; se diz que perdeu o sentido da vida. Neste casos, não podemos dizer que um quadro de psíquico patológico se justifica, responsabilizando apenas o sujeito, como se fosse um ato individual. Assim, desresponsabilizamos a sociedade e o estado diante do compromisso deles de resguardar os determinantes sociais,que são as políticas públicas: a qualidade de vida, a qualidade de um bom lugar para morar, ter lazer, ter o direito de ir e vir garantido, direito de ter trabalho.

 

D.R.: Então, os suicídios estão relacionados sempre aos fatores externos?

A.S.: Se olhar no Ministério da Saúde no mapa do suicídio, você vai falar não de suicídio psíquico patológico. Você vai associar o suicídio às questões de vida. Você vai ver a quantidade de população indígena que tem alto índice de suicídio. Vai relacionar aos números de suicídio no Sul de Minas associada aos usos de agrotóxicos; Vai ver também índice de suicídio em minorias sociais e que sofrem discriminação; em jovens que não têm perspectivas de vida. Existem fatores que geram o agravo e que são considerados de riscos que levam ao suicídio.

 

D.R.: Vemos neste mês diversas campanhas sobre o Setembro Amarelo e muitas pessoas postando nas redes sociais solidarizando pela causa, oferecendo ajuda para conversar. Como fazer este diálogo?

A.S.: Primeiro, para a gente precisa conversar sobre o assunto, a gente não pode fazer o julgamento de valores. O que impede de uma pessoa de falar abertamente sobre isso? Ela tem medo de falar e ser julgada. Para a gente conversar sobre isso, precisamos ter humanidade,empatia,respeito e cuidado. Porque se a gente julga a pessoa que fala isso, se, de alguma forma, nós reprimimos esta fala ou banalizamos, isso faz com que ela recolha, aumentando o fator de risco.

 

D.R.:Qual fator social pode atingir as crianças?

A.S.: A gente não tem muita depressão infantil.O que a gente tem na infância, na verdade,é uma possibilidade da infância não existir.Uma patologização na infância. O que a gente vê muitas vezes são quadros de impulsividades associados à violência social.Muitas das vezes, as crianças sofrem bullying na escola porque elas não se enquadram no padrão. Como eu te falei desde o início, essa criança tem depressão ou ela está reagindo à uma situação aonde ela está tendo o seu direito violado? Porque senão a gente a responsabiliza, e desresponsabiliza o estado e a sociedade por este posicionamento de não ver o que está acontecendo com ela na escola.

 

D.R.: Como agir diante dessas situações?

A.S.:Deve-se sempre procurar a equipe de saúde, não só o psicólogo. Um dado do Ministério da Saúde, como mapa do suicídio, os municípios que possuem serviços de saúde mental (Capes) diminuem em 14% esse indicador. Aqui, em Juiz de Fora, os Capes atendem de segunda a sexta, de 8h às 18h, as pessoas que precisam de ajuda, não precisando passar pela UBS ou vêm do HPS, em caso de Urgência e Emergência.

 

D.R.: Para finalizar, qual a importância da Campanha Setembro Amarelo?

A.S: O que é importante em relação à campanha não é a campanha em si, mas sensibilizar o trabalhador de saúde para formular uma política pública mais consolidada com atenção em atender essas pessoas. Campanha por si mesmo, ela não gera política pública.A gente precisa na verdade, dar uma resposta.Essa resposta é chamar atenção dos atores da Urgência e Emergência, dos hospitais, dos Capes, para, nesse encontro, começarem a discutir sobre o tema, a partir dessa discussão com os profissionais. Se a campanha não tiver uma consequência, ela é vazia. A gente precisa que ela gere mudança e conscientização dos profissionais.

 

 

 




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