Otimizar a ampliação de linhas férreas sem agredir o meio ambiente é o objetivo do projeto Ecodor, que propõe a fabricação de dormentes de linha – peças transversais que oferecem sustentação aos trilhos – com o uso de resíduos da construção civil. Desenvolvido pelas pesquisadoras da UFJF, Mariana da Fonseca e Teresa Barbosa, da Faculdade de Engenharia, e Zélia Ludwig do Departamento de Física, o Ecodor ficou em 3º lugar na 21ª edição do prêmio da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) de inovação e sustentabilidade, na categoria pesquisa acadêmica. Tendo como plano de fundo dados da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária – Abifer, em 2010 aproximadamente 25% da matriz de transporte de carga do país era feito por trens e estima-se que em 2025 esse número atinja 35%. Neste contexto, também aumenta a procura por maneiras de expandir a malha ferroviária de forma sustentável. Por razões econômicas e ambientais, os estudos se concentram em achar materiais alternativos à madeira utilizada nos dormentes de linha. Além da madeira, podem ser utilizados metais e concreto para a produção dos dormentes. Cada tipo de material apresenta características positivas e negativas.
Os dormentes fabricados com concreto podem ser uma saída ao uso da madeira, com uma vida útil três ou quatro vezes maior, bem como uma regularidade geométrica que proporciona o rolamento mais suave e seguro dos trens. Além disso, os dormentes de concreto exigem um menor número de unidades por quilômetro, porém apresentam como desvantagem a excessiva rigidez e menor resistência a impactos. Para minimizar esses pontos negativos, o time de pesquisadoras da UFJF desenvolveu um dormente que agrega em sua composição a mistura de concreto (fabricado com cimento Portland); areia artificial (resíduos de mármore triturado) e fibra de vidro (resíduos de fibra óptica).
NOVAS FINALIDADES PARA OS RESÍDUOS DA CONSTRUÇÃO CIVIL
O que diferencia o Ecodor dos demais dormentes de concreto é que sua composição garante alguns benefícios ao produto final. A professora Mariana da Fonseca explica que utilizar resíduos industriais e também da construção civil sempre foi a intenção do projeto, que nasceu durante suas pesquisas no mestrado. “Não imaginávamos que utilizando esses resíduos seria possível construir os dormentes sem perder qualidade e desempenho, preenchendo os requisitos das normas técnicas da construção, como compressão e elasticidade”. Nessa nova formulação da massa o pó oriundo do beneficiamento do mármore é utilizado como substituto à areia. “O uso do mármore torna o concreto menos poroso, o que diminui os riscos de infiltração, tornando-o mais durável. Esse material é maléfico à saúde, então dar a ele uma finalidade também tem importância socioambiental,” acrescenta.
Para agregar ao concreto os rejeitos de fibra de vidro foram realizados experimentos a fim de analisar interações químicas entre as substâncias. “O concreto tem calcário que poderia atacar as fibras de vidro comuns, porém a que utilizamos tem origem em fibra óptica que possui uma proteção de polímeros ao redor, isso evita que os componentes do concreto interfiram em suas propriedades”, explica a pesquisadora Zélia Ludwig. “A fibra utilizada vem da sobra de vários vidros, principalmente de carbonato de cálcio, silício e fosfato. Essa combinação confere maior resistência e durabilidade. Além disso, o vidro também apresenta propriedades térmicas que protegem o material durante a dilatação, resultado da exposição ao sol”. As sobras desse material têm origem em outro projeto sustentável da professora, que propõe a confecção de fibras ópticas utilizando vidro de lâmpadas fluorescentes, que seriam descartadas.
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Uma vantagem de usar essa tecnologia na confecção dos dormentes é que cerca de 30% do seu corpo é formado por sobras de outros processos da construção civil, isso reduz os gastos na produção e evita que tais rejeitos sejam lançados no meio ambiente. Mariana explica que para a fabricação dos dormentes, com o uso da nova mistura, não são necessários grandes investimentos adicionais em estruturas de produção industriais já existentes. “Na análise econômica outro resultado levantado foi quanto aos custos, mesmo considerando aspectos logísticos, usar os resíduos que seriam descartados, torna o dormente consideravelmente mais barato,” relata.
Para proteger a ideia e garantir os direitos sobre a exploração do produto, foi feito o registro de patente do Ecodor. “Por ter características de um produto que visa à diminuição de impactos ambientais, recebemos uma ‘patente verde’ que tem prioridade durante o processo de avaliação da concessão do Inpi – Instituto Nacional da Propriedade Industrial,” conta Mariana.
As professoras também ressaltam a importância da representatividade feminina na pesquisa. “É muito bacana ver um projeto todo realizado por três mulheres, sobretudo no ramo da construção civil, que é um ambiente majoritariamente masculino,” conta Mariana. Para a professora Zélia, ainda é possível destacar que “muitas vezes ficamos envolvidos apenas em pesquisas nos laboratórios, misturar as áreas de conhecimento dá uma finalidade prática ao que é estudado. A pesquisa sai do laboratório e alcança um propósito social”.
Veja o vídeo produzido pela organização do prêmio
Fonte: Assessoria