Quem chegava do lado de fora da casa de Carolina Turker, na área metropolitana de Atlanta, nesse domingo, 10, pensava que lá dentro havia uma festa. Eram sete carros estacionados na porta. O almoço dominical virou uma confraternização entre brasileiros moradores da Flórida e da Georgia. Os brasileiros daqui acolheram mais de 300 compatriotas moradores do estado vizinho, que deixaram as casas devido à passagem do furacão Irma.
Anfitriões e hóspedes têm em comum o fato de serem imigrantes e brasileiros nos Estados Unidos, mas só se conheceram pessoalmente nas últimas 48 ou 72 horas por causa do furacão.
“Decidimos nos reunir e comer juntos”, disse Carolina. Ela recebeu 15 pessoas em casa, brasileiros moradores da Flórida que receberam aviso de saída obrigatória antes da passagem do furacão.
No almoço, ela conheceu Cleidiane Burney, moradora de Brandnton, na Flórida, que chegou à Georgia no sábado, 9. Cleidiane está hospedada na residência do casal Grace e Aguimar, que também abriram a casa para oito pessoas que vieram para o estado. Grace é amiga de Carolina e ambas resolveram juntar os novos conhecidos no almoço de domingo.
Casada com um norte-americano, Cleidiane, que vive na Flórida desde 2001, já está bem adaptada à realidade da “temporada de furacões”.
“Já passei por vários [furacões], mas foi a primeira vez que tive de deixar minha casa”. O que chamou a atenção foi o tamanho do furacão. “Foi o maior que já passou por lá”. Quando o governo deu ordem de saída obrigatória, ela e o marido resolveram que seria melhor deixar a casa.
Pelo Facebook
“Mas, àquela altura, já não havia hotéis disponíveis aqui perto de Atlanta. Somente no centro, mas todos caríssimos”. Ela viu um post no Facebook de que famílias brasileiras em Atlanta estavam recebendo voluntariamente as pessoas que não tinham para onde ir.
Mais de 5,6 milhões de pessoas da Flórida foram orientadas a deixar as casas. Muita gente escolheu a Georgia como destino, pela proximidade.
São estados fronteiriços, e a Georgia, apesar de também estar em estado de emergência pelo furacão Irma, o receberá com menos intensidade. A maior parte do estado não teve ordem de evacuação.
“Eu não conhecia a família que me hospedou, mas na hora da necessidade, viemos. E graças a Deus deu tudo certo aqui”, contou Cleidiane, que veio com o marido e os três filhos, o mais novo um bebê de colo.
O casal Grace e Aguimar disse que é a primeira experiência de receber em casa pessoas que nem conheciam. Mas atenderam ao chamado de outros brasileiros que começaram a se mobilizar para hospedar gente vinda da Flórida.
“Nós somos cristãos e resolvemos abrir a casa, pensando que seria hora de praticar a fé que a gente tem”, contam.
Rede de mulheres
A hospedagem voluntária não foi planejada.”Eu ia hospedar alguns amigos, mas aí outra família de amigos precisava de um lugar e eu pedi para as amigas daqui, e todos começaram a se envolver e oferecer as casas”, contou Yascara Palma Tom.
Ela diz que começaram a a aparecer mais pessoas interessadas em receber moradores da Flórida.
“Anunciamos no Facebook que queríamos ajudar a comunidade brasileira na Flórida e começamos a conectar as famílias que precisavam de hospedagem àquelas que queriam receber”, conta Yascara, que é parte do Mulheres Brasileiras em Atlanta”, um grupo no Facebook formado por moradoras da região.
A rede de apoio, que começou informalmente, cresceu, ganhou página no Facebook e, além de conectar as pessoas, começou a receber doações de produtos alimentícios e de higiene para os recém-chegados.
A iniciativa delas acabou aglutinando diferentes grupos, que também estavam trabalhando para hospedar pessoas.
Yascara conta que o padre perguntou se ela tinha contatos, porque precisava encontrar mais casas para hospedar pessoas. O mesmo ocorreu com o pastor de uma igreja, que já havia montado uma estrutura para várias pessoas em um acampamento.
“Eu fiquei muito emocionada de ver a solidariedade. A gente podia estar vendo televisão e só vendo o furacão destruindo tudo, mas resolvemos gastar energia ajudando quem precisa de ajuda agora”, afirmou.
Até mesmo algumas pessoas que chegaram e se hospedaram em hotéis estão procurando ajuda. “Os hotéis estão com preços muito caros. Nesta segunda-feira, 11, um casal com uma criança de 2 anos vai deixar o hotel para se hospedar em casa brasileira”, acrescentou.
Vulnerabilidade
Carolina Turker, que abriu a casa para o almoço de domingo, diz que está muito feliz de ter recebido as pessoas em casa. “Eu disse sim, mas fiquei com medo, porque era a primeira vez que eu fazia isso – ter alguém em casa que eu nunca tinha visto”.
Mas a experiência, segundo ela, tem sido boa. “Receber é melhor do que dar, e estou sentindo isso de maneira especial agora”.
Carolina, que é uma das fundadoras do grupo Mulheres Brasileiras no Facebook, lembrou que uma questão importante é o fato de que vários dos que vieram se abrigar com ela são famílias de brasileiros que não estão em status regular e por isso têm medo de pedir ajuda.
“Muitos que chegaram não têm documentos ou estão ilegais. Isso gera mais medo em uma situação em que todos já estão vulneráveis, enfrentando um furacão, que é uma força que a gente não controla”.
Carolina disse que sua satisfação é ver que todos estão bem e que apesar dos desafios que virão pela frente, no pós-furacão, as famílias receberam alento e abrigo. “A gente se sente melhor de estar ajudando e vemos um lado bom da gente, que é poder ter empatia”, conclui.
Fonte: Agência Brasil