Esclerose múltipla não é o fim

“Você tem esclerose múltipla” é uma frase que já foi dita para 35 mil pessoas no Brasil por diversos profissionais da saúde. O quantitativo atual de casos da doença no país é um levantamento da Associação Brasileira de Esclerose Múltipla (Abem). Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a enfermidade autoimune e inflamatória do sistema nervoso central atinge 2,5 milhões de pessoas em todo o mundo. Porém, o diagnóstico não é o fim. Mesmo com ele, pode haver muita realização profissional e pessoal. Pensando nos mitos e assombros que o nome da doença carrega, o Dia Nacional da Esclerose Múltipla, celebrado nesta quarta-feira, 30, configura-se como uma espécie de força-tarefa para nortear debates e orientações sobre a temática.

O médico neurologista Carlos Augusto Damasceno explica que a patologia não tem relação com o tipo de esclerose que atinge os idosos, por exemplo. “As pessoas fazem associações com demência e perda de memória. Outra relação errada é com a esclerose lateral amiotrófica, uma doença degenerativa mais grave. Há muito preconceito da sociedade por não entender minimamente o funcionamento da doença, pois ela, em si, não mata. Caso a pessoa não faça nenhum tratamento, a sobrevida é de 30 anos em média. O que ocasiona a morte são as complicações resultantes da incapacidade física, que só costuma ocorrer diante de um diagnóstico muito tardio”, explica o médico, que também é coordenador do Centro de Atendimento a Doenças Neurológicas Imunomediadas (Cadin) do Hospital Universitário (HU) da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

 MECANISMO DE AÇÃO DA ESCLEROSE MÚLTIPLA E SINTOMAS

O neurologista explica que a doença autoimune afeta principalmente mulheres jovens, entre 20 e 40 anos. No processo da patologia, as células de defesa do organismo atacam o próprio sistema nervoso central, provocando lesões cerebrais, medulares e nos nervos ópticos, causando inflamações nesses locais.

“Os sintomas são variados, pois dependem do lugar afetado pela inflamação. De modo geral, podemos dizer que os sintomas são dormência; formigamento; alteração de sensibilidade nos membros superiores e inferiores; diminuição da força muscular nas pernas, ocasionando dificuldade para andar; tonteira, vertigem, dor ocular, embaçamento visual; tremores; falta de coordenação motora; dificuldade do controle da urina; e disfunção erétil no homem”, pontua o neurologista. “Não tem cura, só controle com tratamento contínuo, que é capaz de evitar as inflamações no sistema imune defeituoso”, complementa, destacando que o paciente costuma apresentar surtos da doença em períodos específicos, mas depois melhora. A enfermidade apresenta, portanto, como característica principal, a intermitência dos vários sintomas.

APOIO EMOCIONAL E GARANTIA DE ACESSO AO TRATAMENTO

Há 13 anos, a Associação de Amigos e Portadores de Esclerose Múltipla de Juiz de Fora e Região (AAPEM) oferece apoio ao tratamento por meio de palestras e encontros mensais. “Caso necessário, acionamos órgãos públicos e até privados com o intuito de garantir que os direitos sejam respeitados. Sem o trabalho que realizamos, muitos não teriam acesso ao tratamento e nem espaço para dividir suas histórias”, avalia Samantha Borchear, presidente da AAPEM/JF, que atualmente tem em seu cadastro 114 pacientes.

Nesta quarta-feira, 30, e na quinta-feira, 31, a Associação realizará palestras nas faculdades de medicina da UFJF e Universidade Presidente Antônio Carlos (Unipac), respectivamente. “Falaremos um pouco a sobre a patologia e a Associação. É preciso entender que a tecnologia atual permite a precisão diagnóstica e o tratamento com medicamentos de última geração. Temos presenciado portadores com alto nível de qualidade de vida, e é exatamente isso que a AAPEM/JF pretende demonstrar. Apesar das limitações, a vida deve continuar. A doença não significa o fim de um portador, mas, sim, um novo começo, que pode ser difícil, mas não impossível”, finaliza.

UMA MULHER ESCLEROUSADA NO FACEBOOK

 

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Articulada na rede, estudante compartilha suas impressões sobre a doença, colhe afetos a cada publicação e inspira aqueles que enfrentam a enfermidade a ter um novo olhar sobre a mesma. Foto: Reprodução/Facebook

Bárbara Rodrigues Silva, 26 anos, casada com o executivo de contas Fernando David Weydt, 25, sentiu o mundo desabar em outubro de 2016, quando recebeu o diagnóstico de esclerose múltipla. “Não tive um atendimento humanizado por parte do médico. Ele não me explicou nada a respeito dessa enfermidade. Foi um dia terrível na minha vida. Esse termo – esclerose – dói muito. Ele assusta mais do que a doença em si. No início, tive dificuldade de pronunciar esse nome e precisei fazer terapia para conseguir lidar com tudo isso”, revela Bárbara, que, após tomar ciência da patologia, tomou decisões radicais. “Larguei o emprego no qual eu era infeliz. Atualmente, faço um curso na área de coach e consultoria. Também estudo Ciência da Religião na UFJF”, ressalta.

Sustentada pela autodeterminação em não se abater e pelo apoio incondicional de esposo Fernando, Bárbara deu voz para os seus pensamentos criando uma página no Facebook intitulada Esclerousada. “Uma coisa que vejo muitos portadores de EM falando é sobre a tal da ‘vida normal’. Afinal de contas… o que é ter a vida normal? Isso é tão subjetivo. O que é normal pra você? É aquilo que segue as regras, os padrões…?”, questiona em uma de suas publicações na página, que, inclusive, tempera, muitas vezes, as informações postadas com boas doses de humor.

Hoje Bárbara pronuncia sem medo o nome da patologia com a qual convive e entendeu, depois de muitos diálogos e pesquisas, que a vida só seria diferente, mas não impossível. A estudante faz uso de uma medicação injetável três vezes por semana chamada Rebif, usada para reduzir a quantidade e gravidade dos surtos. “O remédio abaixa meu sistema imunológico e aí o efeito colateral é como se eu estivesse gripada. O corpo fica ruim, dá um pouco de febre e a fadiga aumenta. Porém, isso não me impede de viver e ser feliz”, destaca.

 

 




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