Em épocas de delações e escândalos, quando o cardápio completo com coxinhas, mortadelas e outras denominações gatronômico partidárias e frigoríficas azedaram de vez, escrever um artigo sobre elementos de fachada pode fazer com que a PF (a polícia e não o prato) venha bater em nossa porta inadvertidamente.
Mas nem tudo o que é de fachada é ilegal. Principalmente quando o assunto é de arquitetura e não de empreiteira.
A fachada é como a casa se apresenta ao mundo, à vizinhança.
Em um empreendimento, é seu cartão de visitas. Nesse caso, inclusive, é o fator que atrairá a atenção do cliente, convidando-o a entrar.
Nesse mundo cada vez mais inclinado às aparências, ter um bom aspecto é fundamental.
E apesar da aparência estar na superfície, não é apenas um elemento superficial.
Em arquitetura, a aparência tem a capacidade de melhorar a estima não só do morador como também de um bairro.
Fachadas decadentes, mal cuidadas, esteticamente deagradadas, criam a sensação de descaso, falta de apreço.
Pelo contrário, um conjunto de fachadas bem cuidadas e harmônicas aumentam a sensação de apreço e cuidado pela região.
É como quando ganhamos um tênis novo: qualquer esbarradinha que damos, nos abaixamos rapidamente para limpar a eventual sujeira. Quando vai ficando mais usado, não ligamos tanto para os esbarrões e sujeiras, o que acelera o processo de degradação.
Nesse sentido, inclusive, foi feita uma experiência desenvolvida por James Wilson e George Kelling, que ficou conhecida como “teoria das janelas quebradas”: abandonaram um mesmo modelo de carro, mesmo ano, mesma cor, nas ruas de dois bairros. Um de baixo índice de criminalidade e o outro de alto índice.
No primeiro bairro o automóvel continuou intacto. No segundo, em poucas horas começaram a “depená-lo”, levando rádio, espelhos, rodas… e tudo o que fosse aproveitável, destruindo o que não conseguiram levar.
Avançando no experimento, uma semana depois, os pesquisadores quebraram um dos vidros do carro que estava abandonado no bairro de baixa criminalidade, que permanecera intacto até então. A partir daí desencadeou-se o mesmo processo de vandalismo visto no outro bairro.
Diante dessa situação surge uma inevitável pergunta: por que um simples vidro partido desencadeia um processo de vandalismo mesmo em uma região supostamente segura?
Obviamente isso não se relaciona diretamente à pobreza, mas à psicologia humana e nossa relação social com meio.
Se os sinais de deterioração e descaso são evidentes e parecem não importar a ninguém, isso “dá o aval” para que se possa continuar deteriorando.
Se os delitos não são coibidos, mesmo que pequenos, “dá-se a permissão” subconsciente para que se cometam crimes maiores.
A beleza, a estética e a harmonia não são determinantes para uma boa convivência social e comportamentos éticos. Vide nossas casas políticas, que são cheias de pessoas alinhadas, engravatadas e que até mesóclises sabem utilizar, mas estão povoadas por pessoas de caráter duvidoso.
Talvez, nesse caso, a culpa não seja deles, mas influência de algumas janelas quebradas no congresso que não estejamos sabendo. Mesmo motivo alegado pelo dono de um frigorífico para justificar a promiscuidade de sua empresa com o poder público: somos corretos em outros países, mas aqui só conseguimos crescer porque pagamos propina.
A beleza, estética e harmonia não determinam uma boa sociedade, mas influenciam.
A beleza, estética e harmonia fazem parte do cerne e da ética da arquitetura. Exercer a boa arquitetura (boa, útil, bela, funcional…) é a melhor contribuição social que o arquiteto pode dar.
O mesmo projeto, fachadas diferentes
Um mesmo projeto pode gerar distintas fachadas, que devem atender ao estilo dos moradores e às características da região. Brises e cobogós, por exemplo, além de darem um charme ajudam a quebrar a incidência direta do sol.
GRAFITE x PICHAÇÃO
A pichação, como expressão de um ato ilícito, degrada o espaço público e reforça a criminalidade. O grafite, por sua vez, traz elementos de arte para a sociedade.
HAITI: REDENÇÃO PELA ARQUITETURA
Tapis Rouge é um exemplo de requalificação do espaço público.
Após o terremoto do Haiti, a Cruz Vermelha, através do programa “ Uma vida melhor no meu bairro”, reestruturou o antigo bairro informal de Carrefour-Feuilles.
O programa arquitetônico foi desenvolvido junto com a comunidade e contempla um anfiteatro ao ar livre, local de encontro para lazer e produção cultural local. Árvores foram plantadas para embelezar e gerar sombra; equipamentos de ginástica foram instalados; a topografia aproveitada para captação de água da chuva; muros foram grafitados artistas da região.
Segundo os arquitetos idealizadores do projeto, “a intenção era criar um espaço mais seguro e limpo, onde os moradores se sentiriam pertencentes e donos do local, reduzindo o crime a violência e o comportamento antissocial do local”.
PARA DICAS, SUGESTÕES E INFORMAÇÕES:
Fabiano Teixeira | Argus Arquitetura & Interiores
(32) 99103-1405