Lições de humanidade de Agostinho – Parte Final

Poderíamos seguir divagando sobre as lições de Agostinho em uma sequência interminável de artigos. Isso por causa da extensão e profundidade de sua magnífica obra. No lugar disso, corremos para a conclusão da série neste quinto texto, deixando, pelo menos, cinco indicações de leituras para os interessados em continuar enveredando pelos caminhos do pensamento deste filósofo brilhante.

Poderia indicar outras, mas ficamos nestas cinco: “Do livre-arbítrio”, “Confissões”, “Cidade de Deus”, “Sobre a Potencialidade da Alma” e “Sobre a Felicidade”.

Para terminar a série, falaremos brevemente da visão de Agostinho sobre o tempo.

O filósofo começa a tratar do assunto com uma frase ao mesmo tempo inquietante e provocativa. Ele diz mais ou menos o seguinte: “quando não me perguntam o que é o tempo, sinto que sei o que seja, porém, se me perguntam, não encontro maneira de explicá-lo”. Ou seja, imaginamos que sabemos o que seja o tempo, porém, na verdade, não temos ideia do que seja.

Na busca por desvendar esse enigmático mistério, Agostinho desenvolve um raciocínio que começa com uma pergunta: existem de fato o passado, o presente e o futuro?

Então, na sequência do raciocínio, constata: o passado não existe objetivamente, ele é, na verdade, a memória de um presente que não existe mais. E o futuro existe objetivamente? Também não! O futuro é a projeção de um presente que ainda não existe.

Passado e futuro consistem em “não ser”. Tanto passado quanto futuro não existem, exceto como memória: o primeiro é a recordação no presente do que já se passou e, considerando o que já ocorreu, o segundo é a especulação que fazemos no presente sobre o que pode vir a acontecer.

Mesmo o presente é um treco estranho porque quando pensamos nele, já se tornou passado e, portanto, já deixou de existir, também tornando-se, portanto, “não ser”.

Na verdade, só existe o aqui e agora, o resto não está acontecendo no mundo exterior, apenas na mente do homem, no intelecto do ser humano que pensa no presente sobre o passado e o futuro.

Concluímos com Agostinho que o tempo não é objetivo (como tendemos a pensar) mas sim subjetivo, pois depende inteiramente do homem. Enquanto o ser humano pensa no tempo, a pedra existe em um eterno presente.

Em suma: o passado é a memória do que já passou, e o nome disso é recordação; enquanto o futuro é a memória do que ainda não aconteceu, e o nome disso é esperança.

Se o tempo se restringe ao presente, apenas ele importa. Independente de reflexão filosófica, sabemos que é bem verdade que só podemos determinar a nossa vida no presente, em cada situação concreta vivenciada aqui e agora. O passado não pode ser revisitado para ser corrigido, o futuro não pode ser previsto em sua diversidade de nuances. Então pensamos: por que deixar o passado atormentar? Por que ficar ansioso com o futuro? Isso não faz nenhum sentido.

Não é por acaso que as Escrituras instruem a fazer o seguinte com relação ao passado: “Esqueçam o que se foi; não vivam no passado” (Isaías 43: 18). Pois: “Ninguém que põe a mão no arado e olha para trás é apto para o Reino de Deus” (Lucas 9: 62).

E sobre o futuro nos ensinam: “Eu sei, Senhor, que a vida do homem não lhe pertence; não compete ao homem dirigir os seus passos (Jeremias 10: 23). Sendo assim: “não se preocupem com o amanhã, pois o amanhã se preocupará consigo mesmo. Basta a cada dia o seu próprio mal” (Mateus 6: 34).

O presente é o tempo que importa objetivamente. Apenas vivenciando-o encontramos alguns rudimentos de controle sobre a nossa vida, certa oportunidade de decidir, a possibilidade de fazer direito e uma chance única para nos corrigir e acertar.




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