A crise da pandemia colocou os jovens com os nervos à flor da pele. Em consequência, apesar da sua forte resiliência, surgiram problemas emocionais de toda sorte, como angústia, ansiedade, agressividade e até mesmo falta de ar e crises de choro em horas inesperadas. Isso tudo foi abordado no programa “Identidade Brasil”, no Canal Futura, com a participação da psicanalista Fernanda Costa-Moura, sob a nossa direção.
Não foi difícil, para ela, abordar esse tema. Tem uma vasta experiência como professora do Instituto de Psicologia da UFRJ e do programa de pós-graduação em teoria Psicanalítica da mesma instituição, além de membro do Tempo Freudiano. Trabalha desde os anos 2000 no estudo dos efeitos da Ciência sobre os jovens, na vida social contemporânea. Revelou-nos suas preocupações com a saúde mental dos seus alunos, nesses tempos de tanta diversidade tecnológica. A sua tese de doutorado liga Ciência à Psicanálise e é, pois, natural que ela deva lidar com elementos antes pouco expressivos, como angústia, ansiedade, depressão e pânico. Sobre cada um deles, fez uma competente digressão. Mas prevê que eles, em breve, serão atenuados – assim que a pandemia der os esperados sinais de regressão, como é a expectativa geral.
Enquanto a crise se manifesta, devemos viver a realidade do uso de máscaras e face-shields, além do hoje popular álcool em gel. Evitar aglomerações é medida saudável, razão pela qual só podemos reabrir as escolas (públicas e particulares) se houver um bom plano de trabalho que resguarde a saúde dos nossos jovens. Dividir as turmas em 20 alunos cada é medida salutar, da mesma forma que se deve manter uma distância de metro e meio entre os alunos. Se isso não for obedecido é todo um esforço que pode ser perdido para a doença.
Temos certeza de que a vida pós-vírus não será a mesma de outros tempos. A angústia de hoje será substituída por tempos mais felizes. Temos uma barreira a superar, como marcou, com muita propriedade, uma pesquisa do Datafolha, encomendada pela Fundação Lemann, o Banco Itaú Social e a Imaginable Futures. Esse trabalho, baseado no censo de 2019, revelou, entre outros itens, a existência de uma acentuada falta de motivação, envolvendo mais de 50% dos alunos de 6 a 8 anos. Além desse dado, a pesquisa chama nossa atenção para problemas estruturais da educação brasileira que precedem a situação de pandemia, como o abismo digital existente entre crianças e jovens com e sem acesso a internet de qualidade.
Num país marcado por desigualdades históricas, a pandemia da Covid-19 revelou, de forma ainda mais clara, a exposição desse cenário. A população em idade escolar nas famílias vulneráveis e sem acesso à internet é muito afetada neste período de isolamento social.
O Brasil conta, atualmente, com 134 milhões de usuários de internet, o que representa 74% da população com 10 anos ou mais. Mas, apesar de o uso da internet atingir metade da nossa população, cerca de um quarto dos habitantes (47 milhões) segue desconectado. Há 26 milhões de não-usuários somente nas classes D e E.
Cerca de 20 milhões de domicílios não possuem conexão à internet, realidade que afeta especialmente a região Nordeste (35%) e famílias com renda de até um salário mínimo (45%). O celular é o principal dispositivo para acessar a rede, utilizado pela quase totalidade dos usuários. Entre quem usa a internet apenas pelo celular e quem não possui banda larga fixa no domicílio é muitíssimo menor a possibilidade de realizar atividades escolares, culturais, de trabalho e de serviços públicos on-line.
Em todo o mundo, 2020 já se configurou como um ano de desafios sem precedentes. Não queremos mais crianças tristes ou agressivas, tampouco essa injusta desigualdade digital. Cabe aos gestores públicos, junto da sociedade, construir medidas adequadas para enfrentar esses problemas. É hora da mudança.