A queda nos investimentos em pesquisas nos últimos anos, principalmente a partir de 2015, deixou o Brasil despreparado para enfrentar a pandemia do novo coronavírus, apontou nesta segunda-feira (17) o físico e presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich. Durante a reunião da comissão que acompanha as ações do governo federal no enfrentamento à covid-19 que debateu investimentos em pesquisa científica, ele e outros representantes da comunidade científica afirmaram que faltam recursos para o setor de ciência, tecnologia e inovação.
Davidovich destacou que o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), em 2020, tem apenas R$ 600 milhões disponíveis, embora a arrecadação prevista seja de R$ 6,2 bilhões, sendo R$ 1 bilhão para crédito e R$ 5,2 bilhões para pesquisa e desenvolvimento. Ele cobrou a liberação do dinheiro contingenciado do FNDCT como forma de enfrentar a crise econômica.
“É um grito da comunidade científica e da indústria a liberação total do FNDCT. Precisamos desses recursos neste ano para superarmos a crise” defendeu.
Davidovich destacou que uma chamada pública do Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), uma da poucas iniciativas para apoiar pesquisas sobre a covid-19, previa em junho R$ 50 milhões para pesquisadores. Porém, segundo ele, seria necessário investir R$ 1,7 bilhão para contemplar todos os projetos apresentados.
“Estamos desperdiçando recursos humanos e deixando de atacar a covid-19 de maneira mais eficaz, usando a ciência, usando a inovação” afirmou.
De acordo com o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ildeu de Castro, mais de R$ 4 bilhões que deveriam ser destinados para a ciência estão sendo usados pelo governo para outros fins.
“Nós estamos com R$ 4,6 bilhões em uma reserva de contingência destinada para pagamentos de outras prioridades do Ministério da Economia como juros e dívidas públicas, mas não destinado à ciência e tecnologia, que aliás é a finalidade legal do fundo” disse Ildeu de Castro.
Segundo um levantamento apresentado por Glauco Arbix, ex-presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), somados todos os editais e chamados públicos emergenciais, o Brasil colocou menos de R$ 500 milhões à disposição das universidades e pesquisadores para enfrentar a pandemia. Desse valor, cerca de R$ 100 milhões teriam chegado efetivamente nas mãos de quem faz ciência, conforme Arbix. Ele criticou a postura de parte dos políticos e de autoridades do governo que reiteradamente atacam as universidades.
“Autoridades criticam violentamente a universidade e colocam suas esperanças na ciência. É um contrassenso que mostra a desorientação de uma parte muito grande da elite política brasileira” criticou.
Ainda que os recursos tenham se mostrado insuficientes na avaliação dos representantes da comunidade científica, pesquisadores têm se mobilizado para encontrar soluções para enfrentar a covid-19.
“Nunca a pesquisa brasileira foi tão encurralada, assim como a universidade. Ao mesmo tempo, a universidade nunca deu exemplo de vitalidade como deu agora. Grupos de pesquisa estão tentando produzir equipamentos, processos, testes e medicamentos pelo Brasil afora com recursos próprios” disse Arbix.
Na avaliação tanto do presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC) quanto do ex-presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), o baixo investimento em ciência, tecnologia e inovação levou o país a um processo de desindustrialização. Eles consideram que o investimento no setor é o caminho para enfrentar o cenário econômico pós-pandemia e auxiliar na retomada do crescimento.
“O pós-guerra motivou a consciência de vários países no desenvolvimento de outro tipo de poder, não o da bomba atômica, mas o da ciência. Estamos em plena pandemia, a questão que aparece é se o pós-pandemia vai motivar também um esforço da mesma natureza” ponderou Davidovich.
O encontro foi proposto pelo deputado João Campos (Republicanos-GO). A comissão mista da covid-19 é presidida pelo senador Confúcio Moura (MDB-RO), que considerou que as falas dos pesquisadores mostram que a situação da ciência é “dramática”.
Fonte: Agência Senado